Os canalhas da Mangueira - Capítulo 3.


Os canalhas da Mangueira.
Capítulo 3 – O corno da cuíca. 
Este conto possui pitadas – senão o saleiro todo – de sexo, traição, aventura e amizade.

Mangueira teu cenário é uma beleza, que a natureza criou...

  Renato é o filósofo-poeta do grupo, estudou nas melhores escolas e pôde desenvolver muito bem o seu intelecto, e isso só o deixou mais canalha ainda; sabe como é: quanto maior o conhecimento, maior o poder de argumentação.
Ele é o tipo do homem de fala doce e olhar tranquilo, os amigos dizem que daria um bom político, pois ele passa uma credibilidade incrível ao falar, até os próprios amigos que sabem que ele está mentindo chegam a ficar na dúvida em diversos momentos, imagine as mulheres carentes, ouvindo todos os gracejos que ele tanto gosta de dizer.
Além de tudo isso, Renato também é um cara boa pinta, possui aquele típico perfil que os homens gostam de colocar em bate-papo de internet: alto, moreno, corpo atlético e olhos claros. Ou como diz aquela música: “Menino do Rio, calor que provoca arrepio, dragão tatuado no braço...”. Pois então, esse é o perfil físico do Renato, com direito a dragão no braço e tudo.
Mas Renato não faz sucesso somente com as mulheres não, o seu jeito tranquilo de ser também encanta os seus amigos, aliás, ele é um diplomata por natureza, sempre que alguém pensa em brigar ou discutir, chega o bon vivant do Renato para deixar tudo em ordem. Ele é assim, um cara boa-praça por natureza. Quando chegou à bateria da Mangueira, logo foi tachado de playboy no primeiro momento, sabe como é, né; aquela pinta de surfista, morador da Barra da Tijuca, aquela cara que fora criado a muito leite Ninho. Favelado também tem seus preconceitos, como todo ser humano. Mas logo que o preconceito foi vencido ele se transformou em um dos ritmistas mais queridos de todo o grupo, justamente por ser um cara extremamente do bem, por tratar todos de igual pra igual, e tudo isso sempre com um sorrisão no rosto. Na Mangueira as pessoas falam assim: “Irmão, quem não se dá bem com o Renato, não se dá bem com ninguém.” E é verdade.
Com tamanhos predicados e uma alma extremamente canalha, não demoraria muito para que Renato começasse a fazer sucesso com a mulherada do morro. Assim como o Tyson faz sucesso com as madames do asfalto, o Renato também faz sucesso com as moçoilas do morro, afinal de contas, todo mundo quer experimentar coisa nova, não é só o pretinho que quer dar uns amassos nas branquinhas dos condomínios não, as pretinhas do morro também querem – e possuem todo o direito - de saber se o branquinho do asfalto possui aquele molejo gostoso na hora de bater virilha. 
E logo no primeiro mês de Mangueira o Renato já fez uma vítima, e uma bela vítima. Ele traçou a Dindinha, uma das passistas mais cobiçadas daquela época, e que até hoje permanece como uma das mais gostosas, só que agora ela aparece pouco na quadra, casou-se com um italiano e vive muito bem em Parma, mas sempre que volta ela faz questão de matar a saudade da pegada do Renato.
Nessa época da Dindinha, Renato, como bom canalha que sempre foi, já sabia que aquele seria um momento importantíssimo para fazer seu nome com a mulherada, afinal de contas, ele precisava fazer tudo muito bem feito com a passista, do contrário, ela falaria mal dele pelo morro inteiro, só que se ele fosse um cara bom, ela iria falar bem – pois mulher não guarda a língua dentro da boca – e as portas estariam abertas para ele seguir espalhando o seu amor pela Mangueira.
E Renato representou, ele sabia que não poderia vacilar, tratou de estar bem dormido, bem alimentado, e fez o que tinha que fazer. Dindinha ficou radiante ao ver que o playboy do asfalto também sabia fazer bem feito, divulgou o material para as amigas do morro e o grande Renato desfruta dessa fama até hoje.
Justamente por isso, Renato se tornou um dos maiores pegadores da Mangueira, quando ele queria variar um pouco, ia para o morro do Tuiuti, vizinho da Mangueira, mas as mulheres do morro sempre foram as suas preferidas, principalmente as pretinhas, inúmeras foram as vezes que ele se apaixonou por uma desse naipe, mas a paixão do Renato sempre foi que nem chuva de verão, vinha com uma intensidade incrível em um momento, e no outro o céu já estava aberto pronto para um novo temporal. 
Renato costuma dizer que as mulheres do morro são bem mais quentes que as do asfalto, que elas possuem menos frescuras e são capazes até de transar agarradas a um ventilador de teto, só para dar prazer para o companheiro, e ele não via essa entrega com as mulheres do seu convício social, aliás, segundo ele, isso só aconteceu uma vez, com a Silvia, que ele é casado até hoje. 
Por conta desse fascínio pelas mulheres do morro, Renato já arrumou muita confusão nessa vida, e foi por causa disso que ele conheceu os amigos Beto, Tyson e Emílio, se não fosse por esses amigos, Renato certamente não estaria mais nesse plano carnal.
O cara tem muita história pra contar, mas uma das mais marcantes, que vira e mexe vem à tona na roda dos amigos no AP do Emílio, é a história do corno da cuíca, que todos os canalhas julgam como uma das melhores e mais perigosas já vividas por Renato.
Apesar de gostar de traçar as mulheres do morro, Renato sempre soube que isso era muito perigoso, afinal, tinha muita mulher de bandido e muita mulher de ritmista da própria bateria da Mangueira, e ele sempre evitava essas mulheres, mas era praticamente impossível, até porque as mulheres mais gostosas eram essas mais perigosas, e Renato sempre foi fã do perigo, desde novo, e tudo isso deixava a situação ainda mais atraente para ele.
Uma vez ele já estava com a arma apontada na cabeça, prontinho pra morrer, pois havia pegado uma das mulheres de um bandidão da Mangueira, até que o Beto, muito considerado com a rapaziada do crime, conseguiu contornar o caso, e depois disso o Renato passou a evitar esse tipo de envolvimento, ou pelo menos tentou.
Mulher de morro é complicado, ainda mais se for gostosa, pois tem sempre alguém bicando, isso é fato, elas nunca estão sozinhas, e o Renato sabia disso, mas mesmo assim pagava pra ver.
Certo dia, o Cosme da cuíca fez a festa de seu aniversário na sua laje, aquele churrasco clássico no alto do morro. Cosme chamou os quatro canalhas, até porque ele sempre gostou muito de todos eles. Chegando lá todos se depararam com a belíssima Iara, esposa do aniversariante, que até então ninguém conhecia, pois o ciumento Cosme evitava que sua esposa desse as caras na quadra, justamente por ela chamar muita atenção.
Nesse dia Iara estava com um shortinho jeans, faltando pouco para aparecer a polpa da bunda, blusinha coladinha, com uns detalhes transparentes, sandália com salto bem alto para valorizar a bela bunda, e a todo o momento mexia nos belos cachos de sua vasta cabeleira, e como dizem que mulher quando quer alguém mexe muito nos cabelos, todos ficaram alvoroçados com aquela mulher, que não era nada discreta  e fazia de tudo para chamar a atenção. Todos os homens que estavam no aniversário olhavam para ela – discretamente, é claro - e era aí que ela se remexia mais ainda, parecia estar amando ser cortejada por todos aqueles machos, e o Cosme já muito bêbado, percebia tudo, mas aparentava não esquentar muito, fazia cara de corno conformado, e talvez fosse mesmo.
O tempo seguia correndo, o pagode seguia comendo, a carne seguia queimando e todo mundo seguia olhando para a tal da Iara, mas ninguém tomava uma atitude, afinal de contas, ela era mulher do parceiro, do dono da festa, teria que ser alguém muito canalha para fazer isso. 
Só que esse canalha apareceu, e essa pessoa não poderia ser outra a não ser o Renato. Em determinado momento da festa os dois sumiram, e todos os canalhas já sabiam o que estava acontecendo, agora só restava se preparar caso desse alguma merda, pois o lema um por todos e todos por um sempre foi muito forte no grupo, e por mais que eles achassem que o Renato estivesse fazendo algo errado, se rolasse porrada eles iriam defender o amigo com unhas e dentes, independente de quem fosse apanhar, e todo mundo sabia que tanto o Beto, quanto o Emílio e o Tyson, eram mestres na arte do porradeiro, e isso sempre ajudava a impor respeito, e por isso mesmo as pessoas evitavam mexer com qualquer um deles, pois sabiam que se tocasse em um, a porrada ia cantar com os quatro.
A sorte é que nesse dia ninguém precisou brigar com ninguém, Renato saiu para dar um amasso de alguns minutos na Iara, só pra sentir a carne, e eles marcaram de finalizar tudo em outra ocasião. Como já estava todo mundo bêbado, a maioria nem se ligou nos inúmeros olhares trocados entre Iara e Renato, teve uma hora que até a calcinha a donzela mostrou para o Renato, que foi embora excitadíssimo, disposto a traçar aquela carne já no dia seguinte, e não deu outra.
No dia seguinte lá estava Renato, dentro da casa do Cosme da cuíca, mandando ver na mulher do cara, que estava na rua trabalhando. Todos os amigos achavam isso a maior loucura do mundo, pois o ideal seria levar a mulher para um motel, ou qualquer outro lugar fora do morro, mas não, Renato gostava exatamente das maiores loucuras do mundo, e por conta disso fez questão de finalizar a Iara dentro da casa do corno, em cima da cama do casal, ele dizia que isso deixava o sexo bem mais gostoso, justamente por conta do perigo, e vida sem risco não era vida para ele.
Só que como os amigos já haviam previsto, nesse dia deu merda. Os dois foderam tanto que chegaram a perder a hora, o cornão da cuíca já estava entrando em casa, quando Renato só teve tempo de esconder suas roupas e ir para baixo da cama. A Iara, um tanto desesperada e suada, tentou disfarçar e dar um passeio com o marido do lado de fora da casa, mas ele não quis, alegou estar cansado, com dor de cabeça e queria dormir logo, precisava cair na cama. Mas ele não podia em hipótese alguma deitar naquela cama, pois o Renato estava embaixo dela, louco para sair dali.
Prevendo que o coro ia comer, Renato tratou de respirar e viu que precisava pensar em algo rapidamente. Foi aí que ele reparou que nas roupas que havia catado as pressas, estava o seu aparelho celular, e a única coisa que lhe passou pela cabeça foi mandar uma mensagem pedindo ajuda para o amigo Beto, que morava a menos de cinco minutos dali.
Renato deu a maior sorte do mundo, pois aquele horário não era uma hora em que o Beto costumava estar em casa, mas como todo canalha precisa de sorte, o Beto estava em casa, viu a mensagem logo de pronto e correu para socorrer o amigo.
Quando Cosme da cuíca pensou em entrar no quarto, um homem começou a bater incessantemente na porta da casa, a pessoa parecia estar nervosa, e Cosme foi correndo para ver o que era.
- Que apavoramento é esse aqui na minha porta, o que aconteceu Beto?
- Cosme, meu amigo, a dona Lourdes ali do bar ta passando muito mal, ela precisa de ajuda e como eu estava passando por aqui pensei em você.
- Mas passando mal de que, homem?
- Não sei ao certo não, até porque não sou médico, só sei que a gente tem que ir lá agora, vem comigo.
Sem dar tempo para que o Cosme sequer calçasse suas sandálias, Beto tratou de arrastá-lo morro acima para o tal endereço onde ele havia inventado que uma mulher estava passando mal.
Foi nesse pequeno período que Renato recolheu suas coisas, ainda deu um baita beijo na boca de Iara, e desceu do morro praticamente correndo, como bandido que estivesse fugindo da polícia. 
Por fim, o Beto desconversou tudo, disse que já haviam levado a senhora doente para o hospital e que estava tudo certo.
Quando Cosme chegou em casa sua esposa já estava bem perfumada, de banho tomado, a cama já estava com os lençóis trocados e ela já estampava um largo sorriso no rosto. 
Depois de toda essa confusão, Beto encontrou com Renato em um bar que fica logo na entrada do morro, ele xingou Renato de tudo o que é nome, disse que essas maluquices ainda iriam matá-lo de verdade. Renato deu um abraço tão forte no amigo que chegou a erguê-lo no ar.
Mas Beto não conseguiu ficar aborrecido por muito tempo, pois Renato estava com um sorriso fora do comum no rosto, estava com cara de abobalhado, cara de menino que acabara de ganhar o primeiro videogame.
No final os dois beberam e riram muito de toda aquela aventura. Beto fez questão de ligar para Emílio e Tyson, que prontamente chegaram ao bar para rir de tudo aquilo até o dia clarear, como bons canalhas. 

Bruno Rico.

Aguarde pelos novos capítulos, pois os canalhas da Mangueira possuem muitas histórias pra contar.      

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