Carta de Anacleto.



Meu caro Malaquias,
Não estranhe tal escrito,
Não estranhe nada,
Apenas leia,
É só isso que lhe peço.

Já lhe adianto que não estou bem – acho que é notável.
A família continua desunida,
Às vezes penso ser melhor
Confidenciar-me a você
Do que a um irmão de sangue.

Minha neta já cresceu,
Cresceu tanto
Que até uma bisneta já me deu.

O tempo passa sem piedade.
Passa no compasso do descompasso
Chegando a me causar embaraço.
É tudo tão rápido
Que me esqueci até das
Vaidades que tanto cultuava
Em minha mocidade.
O futuro que outrora discutíamos
Já se tornou passado há décadas.

Descobri também que de nada adiantou-me
Guardar segredos e viver cheio de medos.
Os medos me deixaram amuado e acuado,
Enquanto os segredos me deixaram
Profundamente amargurados.
Tais sentimentos só resultaram
Em mais rugas em meu rosto.

Sinto saudades do tempo
Que me chamavam de moço,
Hoje só ouço senhor ou vovô.

Ah! Como era bom caminhar pela praça,
Paquerar uma bela moça,
E por fim beijá-la a boca
Desvendando os segredos de sua alma.

Confesso que ando muito
Saudosista e melancólico,
Por isso resolvi escrever
Esta carta para saber como anda
Meu velho inimigo de longa data,
Já que amigos vivos não tenho mais.

Ass. Anacleto Furtado. 

Bruno Rico.

0 comentários:

Postar um comentário