Meu chapéu não serve mais para
Abrandar a fúria do sol em minha face.
Minha fé já não me salva
Da nuvem pessimista que paira sobre mim
Parecendo querer molhar-me com as águas frias da solidão.
A justiça dos homens já não me parece mais necessária,
Tendo em vista que ela é totalmente precária,
E a justiça divina também não me apetece,
Pois só vejo benção bater na porta de quem não merece.
O calçado que era o meu preferido
Hoje não me serve mais
E vive em baixo da cama,
Acuado, desbotado e escondido.
A roupa que eu mais gostava
Parece não gostar mais de mim,
A ponto de negar-se a acolher o meu corpo,
Antes envolto em suas linhas de cetim.
A mulher que ontem regava-me com amor,
Hoje deixou murchar a flor que lhe dava valor,
Dando lugar a um jardim
Que nunca mais germinou com o velho vigor.
A bandeira que antes eu defendia,
E tremulava com pujança,
Hoje está rasgada e jogada no porão,
Refletindo o retrato mais fiel do meu mundo sem esperança.
Afinal, nada mais me serve,
Nem mesmo os meus sonhos de criança.
Bruno Rico.
Eis o retrato pessimista do reflexo turvo da vida. Fazia tempos que não escrevia com tanta melancolia e desesperança, para um poeta altamente crítico isso é sempre bom, sinal de que o tino de esmiuçar o que poucos preocupam-se em pensar não se perdeu.
As linhas acima representam a mais pura arte, a arte de se colocar no corpo do mais inútil dos homens e fazer com que tamanha inutilidade seja cuspida em poesia.
A minha poesia muitas vezes se consiste em viajar e interpretar um mundo que nem sempre é o meu, e o escrito “Nada mais me serve” é mais um desses, afinal, eu sequer uso chapéu.
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