A casa branca, com manchas escuras, ficava na esquina da Flor
de Liz com a Libertários. Era a residência mais pobre de um bairro que sempre
foi nobre, habitado por gente esnobe que tinha horror a pobre.
Os vizinhos apelidaram tal
residência de "a casa preta", e diziam que ela manchava o bairro.
Januário era o homem da casa manchada, com ele moravam filhos
e esposa, e todos tinham a cor da noite.
Certo dia injuriado com o apelido dado ao seu habitat, ele comprou
uma lata de tinta branca e pintou toda a casa, ao final do trabalho ele disse
para sua esposa:
- Margarida, agora eu quero ver esses nojentos ficarem
chamando a nossa residência de casa preta.
No dia seguinte, logo pela manhã, Januário foi dar um passeio
com sua esposa com nome de flor, e antes que ouvisse o primeiro piar de um
passarinho, vozes ferozes desabrocharam:
- Olha lá gente, pintaram a casa preta.
Na semana seguinte:
- A casa preta agora tá mais bonitinha.
Na mesma semana uma conversa entre dois moradores:
- Você segue reto, e depois que passar a esquina da casa
preta é só dobrar a esquerda.
Depois de alguns dias, Januário finalmente percebeu que o
apelido de sua casa não havia sido dado por conta das manchas escuras nas
paredes.E ao constatar o triste fato, ele proferiu um triste discurso para sua
flor:
- É Margarida, não adiantou pintar nossas paredes, e muito
menos adiantará pintar nossos corpos, seremos sempre os moradores da casa
preta, os negrinhos que mancham o bairro.
Bruno Rico.