Foto: Luciano Andrade.
Meu
nome é Maycon, tenho 13 anos de idade. Minha mãe era muito fã do Michael
Jackson, mas ela não sabia ao certo como escrevia o nome dele, daí na hora de
registrar o meu ficou diferente mesmo.
Hoje
já acordei com a molecadinha pedindo pra eu ficar ligeiro, pois agora quem é
dimenor também pode ir preso. Eu só tenho 13, mas tô ligado que daqui a pouco
eles abaixam até a minha idade, ou eu chego até a idade que eles querem, mas
uma hora a gente vai se encontrar, isso é certo.
Pra
falar a verdade, se eu for preso a culpa vai ser minha mesmo.
Tem
gente que fala que tem que ter educação. Mas eu tive!
Quando
eu ainda tinha casa, eu estudava, ia todos os dias pra escola, eu tinha uma tia
que até dormia nas aulas. A outra, a tia Mônica, já chegou a falar que iria
fingir que estava dando aula, pois estava há meses sem receber pagamento, acho
que era uma parada de greve que estava rolando, mas se ela entrasse nessa tal
greve, ia sair ainda mais prejudicada.
Na
hora da merenda era legal, a gente tinha que roubar o lanche dos mais lerdos,
pois não tinha merenda pra todo mundo, e como eu estudava de manhã, e em casa
nem sempre tinha pão, eu ficava cheio de fome durante toda a aula, nem conseguia
me concentrar muito por causa disso, por isso que eu roubava lanche. Analisando
agora, eu acho que foi na escola que eu aprendi a roubar. É, deve ter sido.
No
final do ano dava tudo certo, eu me sentia inteligente pra caramba, pois sempre
passava de ano, depois é que fiquei sabendo que a minha escola não reprovava. Mas
educação eu tive, isso não é desculpa.
Tem
outra galera que fala que a culpa dessa molecadinha estar no crime é por causa
da família, ou melhor, pela falta dela. Mas também não consigo entender isso,
pois eu também tive família.
Minha
mãe me criou sozinha, tudo bem que ela saía pra trabalhar bem cedinho - ainda no
escuro - e voltava pra casa já bem de noite, e boa parte do meu dia eu ficava na
rua. Mas minha mãe era carinhosa, chegava cansada e ainda conseguia me dar
atenção, perguntava como eu tinha ido na escola. Às vezes ela dormia sentada,
ou até mesmo fazendo a marmita para levar no dia seguinte, eu já cansei de
levá-la pra cama e terminar sozinho o que ela estava fazendo, e ela sempre
dizia que eu era um filho exemplar por causa disso. A gente não se via muito,
mas éramos uma família, até porque, aprendi que família é mãe com filho, com
todos os meus amigos era assim. Fiquei sabendo que família é outra coisa no
bairro dos bacanas, mas como nunca fui lá, só posso falar das famílias que vi.
Hoje
eu não moro mais com a minha mãe e nem estudo, a gente morava em um barraco de
invasão, e do nada a prefeitura chegou lá derrubando nossa casa, teve um
policial que deu até um tapa na cara da minha mãe só porque ela queria pegar
uns documentos, nunca vou me esquecer dessa cena. Só sei que no dia a gente
ficou sem saber o que fazer, minha mãe foi morar de favor na casa de uma
conhecida, mas lá não tinha espaço pra dois, daí eu fugi, pois sabia que minha
mãe ia pedir pra eu ficar no lugar dela, mas eu não quis isso, eu me viro muito
melhor sozinho do que ela, sou novo ainda, por isso saí fora; vim escondido
mesmo, até hoje minha mãe não sabe de mim, sinto falta dela, mas qualquer dia
eu volto.
É por
isso que não aceito quando dizem que a culpa do crime é da falta de educação ou
da falta de família, eu tive os dois, e ainda tenho, pois a molecadinha aqui da
praça é a minha família hoje, a gente se protege, cuida um do outro, ri junto,
passa veneno junto, passa fome junto, apanha junto, tudo é junto, e pelo que eu
sei essa é a essência de uma família, estar sempre junto.
Vou
fazer de tudo pra não ser preso, mas se um dia isso acontecer, a culpa vai ser
minha mesmo, pois tive família e tive educação.
Bruno
Rico.