Cápsulas.



Quando tinha oito anos de idade, Rômulo resolveu colocar seus sonhos em uma cápsula. Para isso, ele escreveu tudo que gostaria de realizar até os seus vinte anos de idade em um papel que arrancou de um caderno carcomido, arrumou uma cápsula de alumínio e a enterrou no quintal de casa.
Na manhã do seu aniversário de vinte anos, ele correu para abrir a bendita cápsula. Como havia escrito muita coisa, Rômulo estava meio confuso a respeito de alguns desejos, e por isso queria logo conferir para ver se tinha conseguido realizar alguns, pois a maioria ele já sabia que não tinha conseguido.
Quando abriu a cápsula, o aniversariante se deparou com seus garranchos de infância, mas conseguiu entender tudo perfeitamente, e após ler quase dez sonhos, viu que absolutamente nenhum havia se realizado; a frustração foi imediata e as lágrimas que há tempos não banhavam seu rosto, vieram como chuva de verão: intensas e destrutivas.
Aquele aniversário foi o mais frustrante de toda a sua vida, Rômulo queria trocar a sua cápsula de sonhos por uma cápsula do tempo e sumir do mundo, mas nem isso ele conseguiu.
Os anos foram ficando cada vez mais afoitos, e quando estava com seus vinte e nove anos de idade, Rômulo já era um frustrado de carteirinha, havia se tornado alcoólatra, e a cápsula da vez agora vinha em forma de remédio, que ele tomava para tentar curar a tristeza que parecia enraizada em suas vísceras.
Em uma madrugada dessas de lua cheia no céu, Rômulo voltava para o seu barraco, depois de mais uma noite de bebedeira, e quando estava subindo uma ladeira do morro, começou um tiroteio, aquele velho conflito entre polícia e bandido onde ninguém sabe quem é quem e todo mundo atira pra tudo que é lado. E eis que uma bala acerta as costas de Rômulo, o tiro foi fatal, a cápsula da vez girava quente no chão enquanto a vítima de sua bala esfriava sem vida no mesmo solo.
Por fim, Rômulo deitou-se em sua última cápsula, e a enterraram na mesma terra que tempos atrás ele havia depositado os seus sonhos.

Bruno Rico.



Último colocado.





Deixe-me ser fraco por algum momento,
Deixe-me não querer o desejo da multidão,
Deixe-me discursar um pouco sem o mínimo de razão.

Deixe-me ficar na cama,
Respeite a minha vontade de não querer levantar,
Preciso refazer-me perante este mundo que me perece.

Deixe-me entristecer-me sem culpa,
Deixe-me não querer ser o primeiro, só por um minuto.
Permita-me que eu me permita perder,
Sem culpa, sem nada!

Deixe que meus desejos beijem
O chão da insignificância.
Deixe minhas palavras secando no varal da hipocrisia.

Deixe que só por uma manhã
Eu acorde sem querer ser campeão de nada,
Absolutamente nada!

Mas pode deixar que amanhã eu buscarei
O pódio novamente,
Mas hoje, especialmente hoje,
Eu não quero me cansar com isto.

Por hora, quero apenas deleitar-me
Com minha medalha de último colocado.

Bruno Rico.